terça-feira, 10 de abril de 2012

É no escuro do quarto, nos lençóis amassados entre as pernas e os contornos dos móveis, que ela volta a ter o medo infantil. De repente o dia parece nunca mais nascer, o espaço mórbido e as paredes cinzas lembram a solitária de quem, por mau comportamento, está fadado a permanecer na exclusão. São três horas da madrugada e o relógio nunca arrastou tanto suas horas. O silêncio penetra nos ouvidos, abafa os gritos de uma língua desconhecida. Ela não quer voltar a dormir, foram os sonhos que a levaram até ali, e a única cena que vê, ao fechar os olhos, é de quando ainda era menina. Não era um dia especial, usava seu vestido rodado cheio de laços lilás e tinha o cabelo entrelaçado, jogado no ombro direito. Comia as frutas do jardim e corria, livre. A única preocupação era não sujar o vestido, um dos seus favoritos. E, no segundo seguinte, a escuridão despenca sobre a imagem colorida. Está de volta ao quarto, que nunca pareceu tão pequeno. Está de volta a sua vida, que nunca foi tão acinzentada. Agora já são quase seis horas da manhã, os primeiros raios de sol aparecem nos vãos da janela e os pássaros avisam que a vida continua. Lavar o rosto deve adiantar. Ela cresceu, o vestido rodado cheio de laços lilás está pequeno agora e a árvore deu lugar a qualquer outra coisa que não sujasse tanto o jardim.